Mais um dia começa. Levanta cedo para ir ao trabalho e faz o que todo mundo faz. Redundante. Sai de casa, ainda mastigando o café da manhã, corre para pegar o ônibus antes que pudesse ter a chance de pegá-lo, já se foi. Olha para o relógio, está relativamente atrasado, não sabe o que vem a frente, mas lembra-se do trânsito de todos os dias.
Pega o ônibus seguinte, vinte e um minutos depois... Chega a principal via de acesso ao centro da cidade grande. Nos primeiros quilômetros uma freada brusca, a senhora que acabara de passar na roleta pisa no seu pé, e ele acorda. Estava sonhando com a sua cama, edredom e travesseiro. Resolve ligar o seu mp4 player, põe numa daquelas rádios de notícias, onde a cada 20 minutos tem-se um boletim repetido. Parece que as notícias se repetem - Dejá vù?
Ainda na metade da via expressa, sentado em seu lugar e com o braço na janela, retira os fones, a bateria do dispositivo acabou. Guarda na mochila, retoma o braço à janela e ainda sente a sua cama chamando-o. "VOLTA PRA CASA", dizia em sua mente. Fecha os olhos e tenta voltar ao 'sonho' em que estava mas , subitamente, a sirene de uma ambulância o faz sair de toda aquela fantasia matinal. O motorista do ônibus em que está corta caminho por uma rua do entorno e a ambulância finalmente consegue passar.
Após curvas a direita, esquerda e seguindo reto, seu ônibus sai em um trecho mais a frente da mesma via expressa. Dessa vez um carro estava quebrado e não havia acostamento. Era um desses carros da era 'recall', quem dirigia era uma mulher cujo veículo não conseguiria empurrar sozinha. O ônibus avança, parecendo uma minhoca de metal, ou ainda uma agulha costurando um tecido, só que no asfalto bastante desgastado. Dois pontos antes dele saltar, uma Kombi fecha a passagem de um outro ônibus que vinha a frente, e o motorista, indócil, tenta sair da traseira da mesma e acaba fechando fluxo de veículos da segunda pista. A Kombi, transportando passageiros de forma irregular fica parada por exatos cinco minutos, e ele olha novamente para o relógio pensando em descer do ônibus e ir a pé. São apenas duas passarelas...
Não o faz por pouco. Mas ao chegar ao destino, lembra-se que faz calor naquele dia e o fato de encarar uma passarela em um lugar tão perigoso e com sol forte, o faz pensar em pegar o primeiro coletivo com ar condicionado. No início da passarela, alguns policiais fazem patrulhamento e tecnicamente garantem a segurança e ordem públicas. Nada mal, mas ele, ao olhar os dois homens ali, sabia que aquilo duraria até o meio-dia, quando eles tomariam uma rua paralela a via expressa e seguiriam para o restaurante popular.
Quase na metade da passarela, de onde dava para sentir a vibração dos veículos que passavam embaixo e toda a poluição por eles emitida e ver boa parte daquela imensa avenida, escutou um 'bip' em suas costas. Eram dois motociclistas, os chamados 'Office boys’. A passarela perdera a função 'para pedestres' , pensou. Passaram por ele e após alguns segundos, começaram os tiros...
De repente tudo fica estranhamente sem emitir qualquer som. Sente que caiu de costas naquele chão sujo e quente, e com uma forte ardência no peito. Percebeu então todos os transeuntes parados, ali, olhando-o caído. Fechou os olhos e não sentiu mais nada... era apenas mais uma vítima da violência. Mais um registro estatístico daquela cidade.
Foto - Capa do CD da Banda Coldplay [Viva la Vida - EMI / 2008 @Todos os direitos reservados. Copyrights.]